Diferença entre lucros cessantes e pensão nos casos de acidentes com sequelas incapacitantes ao trabalho.

O artigo 950 do Código Civil determina que, além de indenização por lucros cessantes das despesas por tratamento médico, é devida à pessoa acidentada, com sequelas que impeçam seu trabalho, ou reduzam sua capacidade, pensão vitalícia correspondente à remuneração que receberia, se estivesse em condições normais para trabalhar.

A lei determina, portanto, o pagamento de três indenizações diferentes:

  1. Despesas médicas (tratamento médico do acidente de qualquer espécie, decorrente de ato ilegal praticado por terceiro);
  2. Lucros Cessantes (as parcelas de salário que a vítima acidentada deveria receber em condições normais de trabalho, até que o tratamento médico se finalize);
  3. Pensão vitalícia (pensão vitalícia, no valor da remuneração do trabalho da vítima, que ficou totalmente ou parcialmente incapaz, sequelas estas pós tratamento médico do acidente decorrente da ilegalidade praticada por terceiro);

Os lucros cessantes são os ganhos que a pessoa deixa de receber, em razão de determinado fato, como um acidente com veículo automotor. São, portanto, a perda econômica, patrimonial, que a pessoa sofre pelo fato de não usufruir de sua condição física para o trabalho, por exemplo. [1]

Neste sentido, podemos classificar como subespécie de lucros cessantes a pensão vitalícia no valor da remuneração que a vítima do acidente recebia pelo seu trabalho.

 

  1. TERMOS INICIAL E FINAL:

Caso o advogado elabore pedidos de lucros cessantes em processo judicial, como mencionamos, no mesmo sentido do art. 950 do Código Civil, os “lucros cessantes” vão desde o início da incapacidade até o final do tratamento médico.

A partir de então, inicia-se a pensão vitalícia correspondente ao valor da remuneração que a vítima recebia quando em condições normais de trabalho.

Não sendo elaborado o pedido de lucros cessantes separado daquele de pensão, considerando que a pensão vitalícia é uma espécie de indenização por lucros cessantes, existe possibilidade de julgamento e condenação do responsável pelos danos à pensão desde a data de início da incapacidade da vítima ao trabalho.

A pensão é vitalícia, conforme jurisprudência firme dos Tribunais Superiores, porquanto a vítima necessitará, sem dúvidas, da pensão em sua velhice, lucros cessantes que continuaria a receber caso não fosse o acidente que a incapacitou, totalmente ou parcialmente, ao trabalho.

Nas palavras de Sebastião Geraldo de Oliveira, escritor e jurista:

Ocorrido o acidente de trabalho, sobrevém o período de tratamento médico até o fim da convalescença, ou seja, até a cura ou a consolidação das lesões.

Nessa etapa cabe a indenização de todas as despesas necessárias para o tratamento, bem como todos os lucros cessantes que no caso do acidente de trabalho representam o valor da remuneração mensal que a vítima percebia.

Depois da convalescença ou consolidação das lesões, decidindo-se pela incapacidade para o trabalho, o valor que era devido mensalmente pelo empregador como reparação por lucros cessantes passa a ser devido a título de pensão vitalícia.[2]

 

  1. QUANTIFICAÇÃO

Os lucros cessantes, durante o período de tratamento médico, deverão ser equivalente ao valor da remuneração integral que a vítima recebia pelo trabalho executado antes do acidente.

Entretanto, existindo, após o tratamento médico, sequelas físicas irreversíveis incapacitantes ao trabalho, a pensão vitalícia devida à vítima do acidente será integral se a incapacidade ao trabalho for integral, bem como, por outro lado, será devidamente arbitrada por perícia médica, em casos de incapacidade parcial ao trabalho.

Para a quantificação do pensionamento, portanto, é imprescindível a aferição do grau de redução de capacidade de trabalho da vítima, tarefa que, geralmente, exige perícia técnica.

A tabela DPVAT, parâmetro geralmente utilizado para o estabelecimento do percentual de redução de capacidade, afigura-se como ponto de partida para a quantificação da pensão, a fim de evitar insegurança jurídica.

Entretanto, em diversas oportunidades, a tabela DPVAT não se mostrou adequada, já que foi criada para quantificar as indenizações ligadas às consequências típicas dos acidentes de trânsito, considerando, para o cálculo, as partes do corpo da vítima atingida e os respectivos danos, deixando de lado o perfil socioprofissional da vítima e a redução à capacidade de trabalho.

Considerando que o juiz não está vinculado à prova pericial, desde que motive sua decisão, deve considerar para arbitrar o valor de indenização, a profissão da vítima, seu nível de escolaridade e a idade, a fim de chegar a um grau mais realista de efetiva redução de capacidade laborativa.

A título de exemplo, uma sequela que reduza a força nos membros superiores da vítima pode configurar incapacidade parcial de trabalho, se a mesma possui maior grau de instrução, mas se por seu histórico educacional ou cultural, sempre exerceu trabalhos relacionados ao uso da força, sua incapacidade será total.

A título ilustrativo, trazemos a jurisprudência da 24ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ao condenar uma empresa de ônibus ao pagamento de indenização por danos morais e pensão vitalícia a uma passageira que sofreu um acidente no interior de um veículo e ficou com sequelas permanentes na coluna, senão vejamos:

(…) Por derradeiro, no que se refere ao pedido de pensão vitalícia, merece acolhida a pretensão autoral. Isso porque, concluiu a perícia (fl. 271), in verbis:

“Após submeter a Autora ao competente exame médico-pericial, avaliando seu Histórico Médico e o Exame Físico especializado, constatou-se que o traumatismo sofrido (queda no ônibus), juntamente com a lesão degenerativa que a Autora já possuía (osteoporose) causaram a FRATURA DE VÉRTEBRA L1, cuja lesão é definitiva e permanentemente instalada, resultando em parcial restrição para o trabalho em geral e também para a vida de relação (AVD atividades da vida diária)”.

Assim, evidencia-se que, em razão do acidente, a autora sofreu a perda parcial de sua capacidade laboral, necessária para sua subsistência, tendo o perito constatado limitação funcional de 75% para os movimentos da coluna dorsolombar.”[3]

  1. CONCLUSÃO:

Percebe-se que existem diferenças teóricas e práticas entre “lucros cessantes” e pensão vitalícia devida a título de indenização decorrente de acidente, por exemplo envolvendo veículos automotores.

Apesar das pequenas diferenças teóricas e quantitativas, a pensão vitalícia deverá ser adimplida desde a data de início da incapacidade ao trabalho, seja ela total ou parcial, se tratando, em verdade, da principal parcela indenizatória devida à vítima de acidente.

Esta poderá abranger, no pedido judicial elaborado pelo advogado, de forma simplificada, portanto, os lucros cessantes (período de tratamento médico, indenizado ao valor da remuneração integral em condições normais de trabalho), podendo ser reduzida, posteriormente, desde que constatada sequelas de redução parcial da capacidade ao trabalho, antes, exercido pela vítima.

[1] TJPB, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800350-11.2019.815.2001, 4ª Cam. Cível;

[2] OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por Acidente de Doença Ocupacional. 4. ed. São Paulo: LTR, 2008, p. 93

[3] TJSP, 24ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº 1010359-77.2015.8.26.0224.

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